Depois de mais de dez anos após sua morte, o cardeal arcebispo emérito de Aparecida (SP), Dom Aloisio Lorscheider, voltará para o Santuário Nacional. Atendendo as regras estabelecidas pela Igreja Católica, os restos mortais do religioso serão transladados em outubro para o maior templo mariano do mundo, onde repousará na Capela da Ressurreição. A cerimônia, rara na história da Igreja, envolverá autoridades civis e religiosas, desde a exumação em Daltro Filho, distrito de Imigrante (RS), onde atualmente encontra-se o túmulo de Dom Aloísio, até Aparecida.
A decisão de transladar os restos mortais do terceiro arcebispo de Aparecida foi tomada em maio durante uma reunião na cidade de Imigrante (RS). Representantes da Arquidiocese de Aparecida, da Ordem dos Frades Menores (OFM) e da Prefeitura local participaram do encontro. Nele, foram definidos detalhes do cortejo e das celebrações que serão realizadas em Daltro Filho e no Santuário Nacional.
O acordo sela uma série de negociações iniciadas ainda na época da morte do purpurado, em 2007. Na época, as arquidioceses de Fortaleza (CE) e Aparecida, locais onde Dom Aloísio exerceu seu episcopado, se candidataram para ser o local do último descanso do religioso. Entretanto, decidiu-se enterrar o cardeal no cemitério do convento onde ele passou sua vida após deixar Aparecida como emérito.
“Não havia uma clareza total sobre o que significa a morte de um cardeal e dos processos que devem acontecer a partir dela. Hoje, com tudo mais esclarecido, entendemos que as normas canônicas devem ser seguidas. Dom Aloísio sempre se submeteu à Igreja. Agora não seria diferente”, destaca Dom Frei João Inácio, atual bispo de Lorena (SP) e então Ministro Provincial dos Franciscanos.
Isso porque dois documentos da Igreja Católica especificam com clareza os procedimentos adotados a partir da morte de um bispo ou arcebispo, seja ele emérito ou titular.
O primeiro deles, chamado de Código de Direito Canônico dedica um capítulo sobre os cemitérios. É no cânon 1242 deste documento que o traslado de Dom Aloísio se apoia. “Nas igrejas não se sepultem cadáveres, a não ser que se trate do Romano pontífice, dos Cardeais ou dos Bispos diocesanos, mesmo eméritos, que devem ser sepultados na igreja própria”, esclarece a norma.
O segundo, Cerimonial dos Bispos, é especialmente voltado para o episcopado e trata sobre toda a vida dos mitrados. O sétimo capítulo deste documento especifica diretrizes sobre a morte e as exéquias dos clérigos. O parágrafo 1164 deixa claro que “o corpo do Bispo diocesano será sepultado na igreja, normalmente na catedral da sua diocese”. O texto continua tratando sobre os bispos eméritos. Nele, se afirma que eles devem ser “sepultados na catedral de sua última diocese”. No caso de Dom Aloísio, Aparecida.
“Além das referências canônicas, temos também o sentimento dos clérigos e do povo que vem ao Santuário. Muitos deles veem os túmulos dos demais bispos que já faleceram e perguntam por Dom Aloísio, desejando rezar junto dos restos deles”, afirma o atual arcebispo de Aparecida, Dom Orlando Brandes, que organiza a vinda de seu predecessor.
No Santuário Nacional, a expectativa para receber o corpo do cardeal é grande. No local onde o religioso descansará por enquanto não há nenhuma inscrição. Entretanto, o cenário deve mudar nos próximos dias. Na lápide, além do brasão episcopal e dos dados do religioso, uma placa homenageará o distrito de Daltro Filho.
Dom Aloisio Lorscheider – Nascido em Estrela (RS) em 08 de outubro de 1924, Aloísio Leo Arlindo Lorscheider foi ordenado sacerdote em 1948 e bispo em 1962, após a nomeação do papa João XIII. Além de exercer seu episcopado na Diocese de Santo Ângelo (RS), participou de todas as sessões do Concílio Vaticano II de 1962 a 1965, atuando como membro das Comissões Conciliares. Também foi secretário geral da CNBB, presidindo-a depois por duas vezes. Depois, dirigiu o CELAM em diversos cargos, tornando-se presidente da instituição em 1976.
Foi nomeado arcebispo de Fortaleza em 4 de abril de 1973 pelo Papa Paulo VI. O mesmo pontífice o criou cardeal em 24 de abril de 1976, o que fez com que Dom Aloísio participasse de dois conclaves. Em 1978, o primeiro, que elegeu o papa João Paulo I. Na ocasião, tornou-se o primeiro brasileiro a receber votos em um Conclave, segundo as palavras do próprio pontífice eleito. e depois, tomando parte no que elegeu João Paulo II.
Foi o papa polonês que o transferiu para a Arquidiocese de Aparecida em 18 de agosto de 1995. Nas terras da Padroeira do Brasil, Dom Aloísio foi responsável por dinamizar a vida do Santuário Nacional e criar a Família Campanha dos Devotos. Além disso, estabeleceu novas paróquias e organizou a estrutura clerical arquidiocesana.
Comandou Aparecida até sua renúncia, pedida após atingir o limite canônico de idade, deixando a Arquidiocese em 28 de janeiro de 2004. O religioso entregou o cargo para Dom Raymundo Damasceno Assis em 25 de março do mesmo ano. Em seguida, retirou-se para o Convento dos Franciscanos, em Porto Alegre, onde passou os últimos anos de sua vida. Morreu em 23 de dezembro de 2007, após quase um mês de internação no Hospital São Francisco, em Porto Alegre.
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