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Produção de hortaliças folhosas ganha normas e selo de certificação

Normatização estabelece uso de quantidades adequadas de insumos químicos protegendo a saúde do consumidor e do trabalhador e reduzindo impactos ambientais. (Foto: Allan Modesto/PortalR3)

Um protocolo de boas práticas subsidiado pela pesquisa científica será capaz de reduzir em até 30% os custos do produtor de hortaliças folhosas. A Produção Integrada de Folhosas, Inflorescências e Condimentares (PIFIC) foi desenvolvida para 32 espécies de hortaliças e, além dos benefícios econômicos, procura aumentar a sustentabilidade da atividade, a segurança e o bem-estar do trabalhador e a qualidade dos alimentos produzidos. O grupo das folhosas foi recentemente incluído no Sistema de Produção Integrada Agropecuário da Cadeia Agrícola, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa),

Trata-se de uma normatização que engloba todas as etapas de produção, estabelecendo práticas e procedimentos a serem seguidos por produtores que queiram aderir ao programa. O cumprimento atestado das práticas concede ao produtor um selo de qualidade que agregará valor aos seus produtos.

“Os benefícios econômicos para o agricultor são percebidos nas etapas de produção, com a redução dos custos obtidos com a aplicação racional de fertilizantes e agrotóxicos; na comercialização, com a oferta de um produto com maior valor agregado, além do acesso a novos nichos de mercado”, declara o coordenador da PIFIC, Jorge Anderson, pesquisador da Embrapa Hortaliças (DF).

O especialista ressalta ainda que o consumidor terá a garantia de um alimento seguro e com alto padrão de qualidade. “A maior parte dessas hortaliças são consumidas cruas ou minimamente processadas e, assim, podem ser fontes potenciais de intoxicação alimentar, caso não sejam cultivadas conforme as especificações recomendadas”, frisa o pesquisador.

As 32 espécies de hortaliças da PIFIC

A Instrução Normativa nº 1, de 11 de janeiro de 2021, do Ministério da Agricultura, apresenta as normas técnicas para a produção integrada de: acelga, agrião, aipo, alcachofra, alecrim, alface, alho porró, almeirão, aspargo, brócolis, cebolinha, chicória, coentro, couve, couve chinesa, couve-de-bruxelas, couve-flor, erva-doce, escarola, espinafre, estévia, estragão, hortelã, louro, manjericão, manjerona, mostarda, orégano, repolho, rúcula, salsa e sálvia.

Certificação nacional e linha de crédito

A adesão à produção integrada é voluntária, entretanto o produtor precisa cumprir todas as etapas, inclusive a que permite a rastreabilidade das hortaliças, a fim de obter certificação por meio do selo “Brasil Certificado”, que atesta o uso de boas práticas agrícolas, ambientais e trabalhistas pré-determinadas na condução da cultura. A certificação do produto é concedida por uma empresa credenciada pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro).

O cientista esclarece que, em âmbito nacional, os sistemas de produção integrada e de produção orgânica são os únicos passíveis de obtenção de certificação reconhecida pelo Mapa. “Diferentemente da produção orgânica, o uso de produtos químicos é permitido na PI desde que dentro de limites determinados e que não interfiram na sanidade do alimento, na saúde do produtor e no meio ambiente”, detalha.

Para atender a todos os procedimentos estabelecidos pela PI e que extrapolam o manejo agrícola, o produtor pode recorrer à linha de crédito Inovagro, que oferece vantagens exclusivas de financiamento para a adequação das instalações da propriedade. Esse recurso é destinado à incorporação de inovação tecnológica nas propriedades rurais que visa, entre outros, o aumento da produtividade, à adoção de boas práticas agropecuárias e de gestão da propriedade rural.

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Parceria entre pesquisa, extensão rural e governo

As boas práticas agrícolas e demais documentos necessários para o desenvolvimento da PIFIC estão previstos nas Normas Técnicas Específicas (NTE), que foram coordenadas pela Embrapa Hortaliças (DF), em parceria com o Mapa, representantes da cadeia produtiva e técnicos da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater/DF). Os trabalhos iniciaram no fim de 2017 e seguiram as premissas estabelecidas pela Instrução Normativa nº 27, de 30 de agosto de 2010, que fixa preceitos e orientações para os programas e projetos que fomentem e desenvolvam a Produção Integrada Agropecuária (PI-Brasil).

Boas práticas podem evitar a contaminação dos alimentos

Guimarães ressalta que a adoção das boas práticas contempladas na PIFIC é fundamental para minimizar os gargalos existentes na produção das hortaliças folhosas no Brasil. “Os principais problemas encontrados no cultivo dessas espécies são as contaminações química e microbiológica”, informa o pesquisador. Ele acredita que mesmo aqueles produtores que não têm interesse em aderir à PI, neste momento, deveriam implementar as boas práticas em suas lavouras para conhecer e já obter os benefícios advindos desses procedimentos.

Com relação à contaminação química, o pesquisador esclarece que ela ocorre em decorrência do uso inadequado de agrotóxicos no manejo de pragas e doenças. “Quando a aplicação é feita sem monitoramento e de forma incorreta, as hortaliças podem ser contaminadas com resíduos químicos, gerando também desperdício econômico e contaminação do meio ambiente, além da possibilidade de causar algum dano à saúde do produtor ou do consumidor”, explica o pesquisador, reforçando que, seguindo as práticas recomendadas pela PI, o produtor pode economizar nos custos de produção.

Ele enfatiza que a PI permite somente agroquímicos registrados para a cultura e com a utilização embasada nos preceitos do manejo integrado de pragas e das boas práticas agrícolas. Para auxiliar os produtores e responsáveis técnicos na escolha e na utilização correta e segura, os pesquisadores editaram a publicação “Grade de Agrotóxicos registrados para o manejo fitossanitário em hortaliças folhosas, inflorescências e condimentares no Brasil”. Os autores compilaram as informações existentes sobre o tema para a produção de folhosas e apresentaram os 63 ingredientes ativos permitidos até aquele momento para as 32 espécies contempladas na PIFIC.

Perdas de até 93% no decorrer da cadeia

Para garantir um dos princípios da Produção Integrada, que é o alimento seguro e isento de contaminações, procedimentos adequados devem ser adotados também pelos varejistas e consumidores. Atitudes simples contribuem para estender a durabilidade e reduzir as perdas que ocorrem após a colheita de hortaliças.

Uma pesquisa realizada pela Embrapa Hortaliças sobre qualidade visual e perdas pós-colheita de hortaliças folhosas no mercado varejista do Distrito Federal mostrou que práticas como o manuseio inadequado, seja pelos produtores, funcionários dos estabelecimentos comerciais ou pelos consumidores aceleram o processo de descarte dos alimentos.

A responsável pelo estudo, a pesquisadora da Embrapa Milza Moreira Lana, explica que as hortaliças folhosas são transportadas para o mercado poucas horas após a colheita e isso contribui para que os resultados das más práticas adotadas no campo sejam, muitas vezes, visíveis somente quando os alimentos já estão nas lojas. Como exemplo, ela cita o manuseio descuidado que gera danos físicos, acelerando a transpiração, a degradação de clorofila e o apodrecimento das hortaliças.

Realizados de 2017 a 2019 em duas redes varejistas, os estudos mostraram que o manejo incorreto nos supermercados resultou no descarte das hortaliças. “As consequências das más práticas em toda a cadeia tornaram visíveis na forma de murchamento, amarelecimento, escurecimento e podridão das folhas das hortaliças”, detalha.

Lana explica que as perdas quantitativas de hortaliças folhosas apresentaram valores diversos dependendo de três fatores considerados: espécie hortícola, loja e fornecedor. “O valor médio de descarte de 19% das unidades compradas pelo mercado engloba valores de perdas que variam entre 1,3% e 93,5% a depender da combinação dos três fatores”, observa a pesquisadora. “As perdas que ocorrem no varejo também atingem os produtores rurais, já que os varejistas repassam parte dessa perda para o fornecedor ao pleitear descontos ou bônus nas aquisições futuras”, pontua a pesquisadora.

Durante o estudo, Lana verificou que nenhum dos funcionários da área de hortifrúti, desde o gerente ao repositor, tinham conhecimento sobre o significado dos selos de certificação de qualidade presentes nas embalagens de alguns dos fornecedores de hortaliças folhosas. “Todo o esforço do produtor em desenvolver uma hortaliça com certificação de boas práticas não está sendo reconhecido e valorizado pelo mercado. Por isso, a necessidade de divulgar junto aos varejistas e aos consumidores finais os benefícios da hortaliça oriunda da PI e o significado dos selos de certificação presentes nas embalagens”, observa a pesquisadora.

Água também pode ser fonte de contaminação

A produção de hortaliças folhosas, inflorescências e condimentares ocorre nas áreas periurbanas e nos chamados cinturões verdes, localizados próximos às grandes capitais. Um problema enfrentado pelos produtores é a qualidade da água usada no sistema de produção. O Diagnóstico de Prestação dos Serviços de Saneamento Básico 2019 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) revelou que praticamente a metade do esgoto sanitário no Brasil não é tratado adequadamente.

A pesquisadora da área de pós-colheita da Embrapa, Iriani Maldonade, esclarece que quando a água é contaminada por microrganismos e parasitos patogênicos, principalmente devido ao esgoto doméstico, ela torna-se um meio de transmissão e disseminação de doenças aos animais e às pessoas. Por sua vez, os animais podem contaminar o solo e a água por meio das fezes, gerando um ciclo vicioso.

Em decorrência disso, as águas dos córregos utilizados na produção de hortaliças podem servir como veículo de contaminantes durante o cultivo, a colheita e a pós-colheita. Em todas essas etapas, entre outros fatores, a infecção do alimento pode advir da qualidade da água usada na irrigação, na lavagem de equipamentos usados na colheita e, principalmente, na higienização das hortaliças.

Em 2014, a pesquisadora conduziu um estudo sobre a avaliação microbiológica e parasitológica de hortaliças folhosas comercializadas em centrais de abastecimento e mercados públicos nas cinco regiões do Brasil. Foram coletadas 432 unidades para amostragem de 12 espécies de folhosas, cujos resultados apresentaram algum tipo de contaminação por bactérias ou enteroparasitos.

Para Maldonade, o cenário encontrado naquele ano não deve ter sofrido grandes alterações. Em virtude disso, ela sugere algumas medidas que podem melhorar esse quadro: a adoção das boas práticas estabelecidas na PIFIC como o monitoramento da qualidade química e microbiológica da água utilizada na irrigação e nos procedimentos de pós-colheita; e a construção de estação de tratamento de esgoto (ETE) sanitário nas propriedades.

A pesquisadora cita a pesquisa da Embrapa Hortaliças sobre um protótipo de ETE que tem apresentado excelentes resultados na purificação da água para uso na produção de hortaliças. “A qualidade da água contribui muito para minimizar esses problemas”, reforça, acrescentando outras ações simples como evitar a circulação de animais domésticos na área de produção e atentar-se para a distância e a localização da fossa séptica em relação ao espaço de cultivo. No “Manual de boas práticas agrícolas na produção de alface”, o produtor tem acesso a diversas informações que podem ser utilizadas também no cultivo de outras hortaliças folhosas.

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