A população e os turistas do Litoral Norte de São Paulo, nas últimas semanas, têm vivenciado um misto de dúvida e curiosidade, em virtude de um turista francês de 59 anos, no início do mês, na Praia de Lamberto, e uma senhora de 79, na última segunda-feira, na Praia Grande, ambas em Ubatuba (SP), terem sido vítimas de investida de tubarões. Há cerca de 30 anos não ocorriam casos de tubarão na região, segundo o Instituto Argonauta, organização que realiza monitoramento em na cidade desde 1998.
Para o pesquisador científico do Instituto de Pesca (IP-APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Alberto Ferreira de Amorim, um dos mais experientes especialistas em elasmobrânquios em São Paulo e no Brasil, ainda que tenham sido ocorrências seguidas, “no mundo ocorrem cerca de 50 mortes anuais causadas por investidas de tubarão. Já os acidentes são em maior número e podem ou não ser fatais”.
O pesquisador do IP explica que o aumento das temperaturas no litoral atrai mais visitantes, resultando em maior movimento nas águas. Nesses casos, se os tubarões se aproximam das áreas dos banhistas, podem confundir a agitação das pessoas com presas.
Outro pesquisador científico do IP, que colaborou na elaboração da nota do Instituto Argonauta, do qual faz parte no Conselho Diretor, Venâncio Guedes de Azevedo, diz que “o comportamento destes animais faz com que algumas espécies venham para áreas mais rasas nas épocas quentes do ano, para dar cria e se alimentar. Sempre fizeram isso. Logicamente, com o crescente aumento do número de pessoas frequentando o litoral, existe a possibilidade do aumento do encontro com esses animais no mesmo ambiente, e isso não necessariamente implica que ocorrerá interação entre eles. A ocorrência de investidas é bastante esporádica e a população não deve entrar em pânico devido ao ocorrido em Ubatuba”, afirma.
Os dois cientistas contribuíram com conhecimentos e experiências da área para a elaboração de conteúdo do livro “Encontros e desencontros com tubarões e raias: uma história (não) contada por pesquisadores brasileiros”, o qual, de acordo com Azevedo, “registra os esforços e valoriza a experiência adquirida por quem tem se dedicado a estudar estes animais”, muitas vezes tido como vilões, mas que na verdade têm sido vítimas de pesca não sustentável.
Relatório técnico
De acordo com um relatório técnico – disponibilizado à família da senhora ferida, ao Instituto Argonauta e demais interessados – elaborado pelo especialista do Laboratório de Pesquisa de Elasmobrânquios da Universidade Estadual Paulista, Otto Bismarck Fazzano Gadig, “…o agente causador do trauma foi uma espécie de tubarão de médio a grande porte, com cabeça arredondada, focinho curto (morfologia acompanhada pelo contorno do maxilar superior), de boca proporcionalmente larga em relação ao comprimento, dentes largos, serrilhados, moderadamente recurvados e com espaçamento interdental (considerado aqui entre as pontas dos dentes) igual ou maior do que a altura da coroa dos dentes (sobretudo na região frontal e lateral da mandíbula)”.
Bismark ainda relata no documento que as características sugerem ser de duas espécies: tubarão-tigre (Galeocerdo cuvier) e tubarão cabeça-chata (Carcharhinus leucas), que fazem parte da fauna da região costeira, tendo comportamento natural em seus hábitos de busca por alimento e reprodução.