Jardinópolis: ‘Capital da Manga’ mantém deliciosa tradição de se comer a fruta no pé

Referência de exportação até os anos 1980 e com uma produção ativa até hoje, cidade dos “bocas-amarelas” tem avenida com mangueiras plantadas em toda a sua extensão: o pomar público

Referência de exportação até os anos 1980 e com uma produção ativa até hoje, cidade dos “bocas-amarelas” tem avenida com mangueiras plantadas em toda a sua extensão: o pomar público. (Foto: Divulgação)

A pessoa chega e, com orgulho, se define como “boca-amarela”. Tenha certeza de que ela só pode ter vindo de um lugar: a simpática Jardinópolis. O município de 45 mil habitantes na Região Noroeste do Estado – que está a 331 quilômetros da Capital – é conhecido como a “Capital da Manga”. A Lei Estadual 4.722/1985, aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, oficializou esse título que segue sendo defendido com empenho por produtores, grupos de preservação da memória local e a população em geral.

A presença do fruto na rotina das pessoas de lá remonta ao início do século passado, época em que a manga respondia de forma importante na economia local. Novas culturas ganharam espaço e relevância – como o abacate, cana-de-açúcar, milho e soja -, mas a deliciosa fruta amarelada segue presente no dia a dia e nas raízes de quem vive ali.

Conta a história oral que as primeiras mangas foram trazidas da Bahia pela família do primeiro prefeito de Jardinópolis, Dr. João Muniz Sapucaia, na década de 1890. Os caroços dessas mangas foram plantados em um sítio, um deles vingou e daí começou o cultivo da fruta na cidade. Nessa época, os caroços de manga tinham “preço de ouro” e eram comercializados para posterior plantio. Na cidade, as mangueiras tiveram solo fértil e clima ideal.

Estradas de ferro
Já na década de 1910, com a fama da qualidade se espalhando, as mangas jardinopolenses passaram a ser exportadas para São Paulo e, de lá, para outros centros do Brasil. Tudo pelas estradas de ferro, já que o município era cortado pelas linhas da antiga Companhia Mogiana.

Geralmente, os exportadores arrendavam o pomar de manga de um produtor, a colhiam, embalavam com muito cuidado – e, em alguns casos, até mesmo em papel seda – e as remetiam para a Capital paulista, o grande centro comercial do produto. A partir de 1940, um empresário local criou uma transportadora específica para levar as mangas de Jardinópolis/SP para São Paulo e Rio de Janeiro. Desta vez, de caminhão. Dali pra frente, o modal rodoviário passou a ser a principal forma para escoar a produção.

Segredo de qualidade
Uma das técnicas da época para garantir a qualidade elevada do produto vindo de Jardinópolis era a colheita e o embalo das frutas com boa parte de seu talo. Eles eram removidos apenas na chegada ao destino, garantindo que as mangas permanecessem frescas durante o trajeto. Com tamanho cuidado e vocação, Jardinópolis despontou, na primeira metade do século passado, como grande produtora e exportadora de mangas do Estado.

Avó de Portinari
Curiosamente, a pessoa considerada a primeira grande exportadora de mangas de Jardinópolis é a avó materna do pintor Candido Portinari, dona Maria Sandri Torquato, a “nonna de Jardinópolis”. A atividade era importante na família que o renomado pintor retratou sua avó no ofício de encaixotar mangas. Uma reprodução do desenho “Nonna Encaixotando Mangas”, de 1956, se encontra no hall de entrada da Câmara Municipal de Jardinópolis atualmente.

Logo depois de Maria Sandri, surgiram outros produtores e exportadores de mangas na cidade. Outro que merece destaque é Crescêncio Avino, que herdou o ofício do pai, cuja safra de mangas de 1933 está retratada na mesma tela de Portinari.

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Vale lembrar que a cidade tem em sua história uma bem-vinda diversidade de povos, talvez, o mesmo espírito que possibilitou que as primeiras mangas baianas encontrassem abrigo, espaço e dedicação para se multiplicarem em terras paulistas. Formada originalmente por imigrantes italianos, portugueses, sírio-libaneses, japoneses e espanhóis, chegados ao Brasil entre o final do século 19 e início do século 20, Jardinópolis também recebeu famílias advindas das regiões Norte, Nordeste e outras cidades do Sudeste brasileiro.

Boca amarela
A fama de produzir mangas inigualáveis fez com que os moradores da cidade ficassem conhecidos como “boca-amarela”. Mesmo com o passar do tempo, ainda se usa esse termo quando se deseja indicar algo que seja genuinamente jardinopolense.

E não para por aí. Realizada anualmente a partir de 1973 – até meados da década de 1990 – a Festa Municipal da Manga marcou época e era momento importante no calendário oficial do município.

Ainda no auge da produção, em 1986, foi implantada no plano viário da cidade a Avenida das Mangueiras, com árvores da fruta plantadas em toda a sua extensão. Hoje, a via e o seu prolongamento têm o nome Prefeito Newton Reis. O lugar é frequentado diariamente pela população para a prática de atividades esportivas, como como caminhada e ciclismo. Mesmo com seu nome original modificado, alguns hábitos não mudam nunca: em época de produção de mangas, é muito comum ver pessoas colhendo as frutas neste lugar. Como era de se esperar, e celebrar, a avenida se transformou em um grande pomar público.

Hino, brasão e o Manguito
O cultivo da manga é tão marcante em Jardinópolis que a fruta aparece até mesmo no hino da cidade. Sua letra apresenta a cidade como “Capital da Manga, com louvor”. Uma manga também foi inserida no Brasão de Armas do Município, representando a “delícia da fruta tropical, nativa em nossa terra e responsável por grande parte da economia de nosso Município”.

Para as crianças de todas as idades, na década de 1990, foi criado o mascote do município, o “Manguito”, presente em eventos realizados pela Prefeitura. Esta foi mais uma forma de valorizar o fruto que alimentou a economia e as tradições da acolhedora população de Jardinópolis por tantas décadas. Saiba mais sobre Jardinópolis pelo https://www.youtube.com/@descobrindojardinopolis

DELÍCIA LOCAL
Receita de Doce de Manga (receita da jardinopolense d. Maria Rueda)
O tipo de manga adequado para essa receita é o “coração” e fruta deve estar madura;
1. Descasque e cozinhe a quantidade de frutas que quiser;
2. Depois de cozidas, passe as frutas ainda mornas em uma peneira “de nylon”;
3. Coloque a massa em um tacho ou panela;
4. Para cada prato (comum, de jantar) de massa, adicione um prato de açúcar;
5. Cozinhe em fogo baixo e mexa sem parar por 1h30;
6. O doce pronto ficará “vidradinho”, despeje-o em uma vasilha quadrada ou retangular. No dia seguinte, o doce estará prontinho para ser saboreado.

Obs: meia caixa plástica (de colheita) de “mangas coração” rende cerca de 6kg de doce pronto.

Obs: Na terra dos “bocas-amarelas”, a temporada do doce de manga começa em outubro.

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