Pesquisadoras do Laboratório de Desenvolvimento e Inovação (LDI) do Instituto Butantan estão testando uma pomada com alto poder cicatrizante cujo princípio ativo é produzido por uma espécie de fungo isolado da Caatinga. O uso tópico da pomada, testada em convênio com a startup BiotechnoScience Farmacêutica, foi capaz de regenerar o tecido da pele machucada de forma muito eficiente, sem induzir a formação de cicatrizes ou de queloides.
“A pomada auxilia no processo de cicatrização natural com produção de colágeno no tecido, deixando a cicatrização muito mais uniforme, sem formação de queloides”, afirma a pesquisadora Tainah Colombo Gomes, fundadora e CEO da startup BiotechnoScience Farmacêutica, que desenvolve a pesquisa em parceria com o Instituto Butantan.
O estudo pré-clínico demonstrou que “a pomada em desenvolvimento é segura para uso tópico e produz mais colágeno na pele afetada do que as pomadas cicatrizantes já comercializadas”, ressalta a pesquisadora.
Tecnologia criada no Butantan
Foram os pesquisadores do LDI Ana Olívia Souza e Durvanei Augusto Maria que descobriram o potencial cicatrizante da molécula produzida pelo fungo Exserohilum rostratum presente na vegetação da Caatinga, existente em vários estados do Brasil.
Ana Olivia relata que o estudo teve início em 2010 com o isolamento do fungo, e este bioma foi selecionado por ser ainda um ambiente muito pouco estudado e por ter uma rica biodiversidade, tanto em vegetais como em espécies de micro-organismos.
Os princípios ativos produzidos pelo fungo foram testados no LDI e mostraram moderada ação antibiótica, ou seja, foram capazes de matar bactérias e fungos.
“Ao serem testadas com relação ao efeito antitumoral, ou seja, a capacidade de matar as células causadoras de câncer, surgiu a hipótese de que uma das moléculas poderia ter efeito na regeneração celular, que é um processo relacionado à cicatrização de feridas”, conta Ana Olívia.
Com esta hipótese, novos estudos foram conduzidos in vitro em células endoteliais e fibroblastos para testar o efeito e o mecanismo de indução da regeneração celular. “Após inúmeros testes, incluindo estudo pré-clínico, o poder de cicatrização foi comprovado, e em 2018, o Butantan entrou com o pedido de patente de uma formulação com ação cicatrizante junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial”, afirma Ana Olívia.
Inovação
Com a patente e um potencial produto em mãos, o Escritório de Inovação e Licenciamento Tecnológico do Butantan orientou Tainah a buscar financiamento do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) e criar uma empresa para condução dos estudos, alinhada à Lei de Inovação (10.973/2004). A lei prevê que empresas possam utilizar os laboratórios de instituições científicas e tecnológicas, como o Butantan, por meio de um acordo de colaboração e de compartilhamento de infraestrutura. O programa PIPE FAPESP é mantido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
“Quando se tem uma tecnologia que foi gerada na instituição, mas não é bem o seu ramo de atuação, normalmente se criam spin-offs acadêmicas, nas quais as empresas podem ficar alocadas dentro do instituto por um acordo de codesenvolvimento, com previsão de licenciamento e termos de compartilhamento da estrutura laboratorial”, explica o gerente de Inovação e Licenciamento Tecnológico do Butantan, Cristiano Gonçalves.
Pelo acordo, a patente poderá ser licenciada para a BiotechnoScience Farmacêutica, que está desenvolvendo o produto de acordo com as normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para registro de produto dermatológico. No momento que for comercializá-lo, a empresa depositará royalties ao Butantan.
“Tudo o que o Butantan gastou com a patente será ressarcido. É uma forma de alavancar a tecnologia e permitir o investimento de forma retroativa, além de garantir a devolução do investimento público na tecnologia e na inovação e permitir a criação de empresas interessadas em acelerar o desenvolvimento do produto”, esclarece Cristiano.