Aplicativo de ex-aluno de Etec chega a 30 países combatendo a violência

O Todas Por Uma nasceu como Trabalho de Conclusão de Curso, venceu um reality show e quer chegar às empresas, aumentando seu potencial de proteção às mulheres vítimas de violência ‌

Mateus de Lima Diniz já vê seu app, nascido na Etec, salvar mulheres da violência em cinco continentes. (Foto: Divulgação)

Foi dentro de uma Escola Técnica Estadual (Etec) que nasceu o Todas Por Uma – um dos mais importantes aplicativos de combate à violência contra a mulher no Brasil. Referência em tecnologia, já está presente em mais de 30 países.

No fim de 2019, o Todas por Uma era ainda um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) na Etec Prof. Horácio Augusto da Silveira, zona norte da Capital. Mas a ideia do aluno Mateus de Lima Diniz, do curso técnico de Desenvolvimento de Sistemas, já estava sendo incubada havia algum tempo.

“O Todas por Uma foi criado por uma criança de oito anos”, ele diz, referindo-se à violência doméstica que presenciou ainda menino. “Quando cheguei à idade em que poderia criar o aplicativo, não tinha dinheiro para pagar desenvolvedores; percebi que poderia atingir meu objetivo por meio do estudo. Foi o que fiz na Etec.”

O sucesso do aplicativo foi imediato. Já em maio de 2020, Mateus levou o primeiro lugar no reality show Expo Favela, organizado pela TV Globo. De 23 mil inscritos em todo o país, dez projetos haviam sido selecionados para o participar do programa. E entre os dez, foi o de Mateus que conquistou os jurados.

Projeto bem costurado

Depois que terminou o curso, Mateus teve ao seu lado o colega de TCC, Carlos Andrade Rocha, e um grupo de professores ainda debruçados sobre a ideia, até que o aplicativo estivesse apto a ser baixado nas lojas de aplicativos. Em seguida, Carlos deu lugar a Leonardo Salazar, também colega da Etec, no aperfeiçoamento do aplicativo.

“A pergunta que eu me fazia era como entrar na casa do agressor sem ser notado”, conta Mateus. A resposta está na tela do aplicativo, que simula uma propaganda.

A um breve balanço do celular, um anjo é notificado. Anjo é o nome que Mateus usou para as pessoas do círculo próximo da vítima – aquelas que, cadastradas no aplicativo, podem acudir a vítima. A partir daí, a cada 30 segundos o app emite um relatório do pedido de socorrro.

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Essa função é importante porque reforça o relato da vítima no momento em que for elaborado o boletim de ocorrência.

Também é possível evitar lugares perigosos (um “mapa de calor” indica as áreas mais violentas em todo o país, com uma sinalização que passa do amarelo, ao laranja e, finalmente ao vermelho) e encontrar a delegacia mais próxima.

Próximos passos

A ideia agora é levar o Todas Por Uma às empresas, cercando por outras frentes a prevenção da violência, mais do que só a culpabilização do agressor.

Dentro de um ambiente corporativo, parte-se para a educação do público masculino e obtém-se o compromisso do empregador em aumentar o contingente de mulheres contratadas em seu negócio.

“No Brasil, um dos maiores obstáculos para as mulheres que querem se ver livres de um companheiro abusivo é a dependência financeira – caso de 52% das mulheres em situação de risco”, avisa Mateus, que abarca crianças e pessoas LGBTQIA+ entre o vasto público exposto a ataques físicos, psicológicos e patrimoniais – e que precisa de ajuda.

Para chegar a um produto tão eficiente, Mateus estudou, durante o seu TCC, todas as tecnologias do mercado, dos órgãos governamentais às empresas privadas e startups.

Ajuda na palma da mão. Ou em um brinco

“Na Etec, desenvolvemos a tecnologia para o aplicativo ser escalável. Sua capacidade é de mais de um milhão de usuários por dia”, conta Mateus, que viu seu trabalho ser transformado em artigos científicos e teses de mestrado e doutorado.

Aos 24 anos, ele quer mostrar também que os homens podem e devem engrossar a fileira do combate à violência contra a mulher.

“A cada minuto, 35 mulheres sofrem violência no Brasil – são mais de 22 milhões de vítimas passando por algum tipo de importunação sexual. Isso equivale à soma das populações de Portugal, Austrália e Uruguai”, afirma.

Pensando no fato de que muitos agressores tiram celular da vítima e bloqueiam a internet da casa, Mateus está desenvolvendo também um hardware que fica oculto sob peças de uso diário das mulheres, como um colar, um brinco ou uma embalagem de pó compacto.

Uma vez acionado, a um pequeno toque, o hardware, batizado Nice em homenagem à mãe de Mateus, localiza a vítima pelo wi-fi público ou de um vizinho cadastrado. O trabalho agora é tornar o hardware, que hoje cabe na palma da mão, ainda menor.

Se aos oito anos Mateus percebeu que a violência era um mal a ser combatido, agora ele acredita que o mal precisa ser extirpado. “Hoje sonho com o fim dessa tecnologia, com o dia em que ela já não será mais necessária.”

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