Meias coloridas, rosto pintado e nariz de palhaço. Quem passa pelo 36º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano (BPM/M), localizado em Embu das Artes, na Grande São Paulo, se depara com dois policiais que nem sempre usam o mesmo uniforme que os demais. Isso porque, em 2016, os cabos Wisnheski e Zalma criaram o projeto “PMs da Alegria”. Eles fazem visitas, participam de eventos e dão palestras dentro e fora da corporação vestidos de palhaço.
O projeto do capitão Edinho e do soldado Risadinha, nome de seus personagens, começou a partir da amizade dos policiais, que estão no batalhão há 15 anos. Mas foi em 2011, quando Zalma ajudou Wisnheski em uma ocorrência, que o caminho dos dois se uniu, e em pouco tempo descobriram que partilhavam de um desejo em comum: fazer visitas a pacientes em hospitais.
Zalma sofreu um acidente de carro em 2009, chegou a ficar 5 dias em coma, mas saiu sem nenhuma sequela. Desde então, queria agradecer pela vida levando alegria a outros pacientes. “Sempre fui palhaço, e como o ambiente hospitalar é triste, queria fazer a atividade no hospital, mas ninguém acolheu a ideia”, conta.
Antes mesmo de se tornar policial, Zalma já se fantasiava de palhaço em festas de crianças na igreja que ainda frequenta. “Nunca imaginei fazer nada social com a polícia”, diz.
Já Wisk, como é chamado, queria formar um grupo de pessoas para se fantasiarem de palhaço e visitarem hospitais. Foi aí que sua esposa lembrou que Zalma se vestia de palhaço na igreja e, então, os dois começaram a conversar sobre serem uma dupla de palhaços.
O primeiro passo para o projeto sair do papel foi quando Wisk se inscreveu no curso “MadAlegria”, ministrado, em sua maioria, por estudantes de medicina da Universidade de São Paulo (USP). Lá, ele desenvolveu as técnicas para ser um palhaço. “Fazer uma pessoa chorar é fácil, agora, sorrir não é tão simples quanto parece”, conta o cabo.
O projeto
Foi na festa de aniversário de 13 anos do 36º BPM/M, em 2016, que os dois atuaram juntos como palhaços pela primeira vez e deram início ao projeto, registrado oficialmente em seus nomes. Os personagens, Wisk como capitão Edinho e Zalma como soldado Risadinha, levam esses nomes em homenagem aos pais.
“Na minha cidade, em Embu Guaçu, sou conhecido como sorriso e queria levar o legado que meu pai me deixou, então ficou risadinha”, comenta Zalma. Já Wisk diz que seu apelido surgiu em uma apresentação no “MadAlegria” ao ter que criar um personagem. “Levei meu quepe da PM e os alunos passaram a me chamar de capitão. Aí para homenagear meu pai, que ainda é vivo, ficou capitão Edinho”. O curso também inspirou o nome do projeto, PMs da Alegria.
Para Zalma, os personagens vêm com a intenção de quebrar alguns estereótipos que algumas pessoas têm sobre a polícia. “Queria trazer o herói, como as crianças costumam nos chamar, para perto da sociedade e quebrar alguns preconceitos sobre a instituição de que todo mundo é bravo e ignorante. Somos seres humanos, a gente também brinca”, diz.
Desde a primeira apresentação, as atividades não pararam mais. Na Polícia Militar, os palhaços visitam quartéis, festas de aniversários, formaturas e dão palestras para policiais e centros médicos. Já no tempo livre, visitam hospitais, igrejas e fazem apresentações com temas como drogas e saúde mental nas escolas. “O objetivo é levar alegria e informação para crianças de 0 a 100 anos”, brinca Zalma.
Os palhaços da PM chegam a fazer 40 eventos no mês e são responsáveis por tudo no projeto, desde montagem do material, administração de agenda, desenvolvimento das artes visuais e postagens nas mídias sociais. Zalma também faz faculdade de artes visuais para ajudar a melhorar o projeto.
Ações
Dentre tantas ações realizadas ao longo de 7 anos, algumas ficam marcadas na memória dos policiais e também de quem participa delas, como no caso do comandante do 36º BPM/M, tenente coronel Maurício da Mota. Emocionado, ele lembrou a vez que foi com os palhaços visitar no hospital a mãe de Wisk, que estava internada com AVC.
“Me marcou bastante, fiquei até mais preocupado que ele, que soube lidar muito bem com a situação”, disse o comandante. Três dias após a visita, a mãe de Wisk teve alta.
Outra ação que marcou bastante Wisk e Zalma foi quando visitaram no hospital um menino de 6 anos que se dizia fã dos PMs da Alegria. O sonho dele era se tornar policial e ver os dois palhaços de perto. No dia da visita, os policiais colocaram uma medalha no pescoço do garoto e todos ali presentes fizeram continência. “Ele dizia que era um policial. Três dias depois ele morreu, isso abalou muito a gente”, comenta Wisk.
Os cabos também promovem ações solidárias, como doação de alimentos e brinquedos, e também incentivam a prática esportiva, principalmente em crianças. Uma vez por semana, Wisk dá aulas de jiu-jitsu na escola Lúcia Castro Bueno, em Taboão da Serra. Dentre os alunos, está o pequeno Luriel, de 14 anos, que tem autismo. Desde que começou a praticar artes marciais, há um ano e meio, a melhora na qualidade de vida é sentida por quem convive com ele.
“Luriel era um menino calmo e fechado, nem conversava direito. Depois que começou a praticar jiu-jitsu, ele se abre mais e já sai até sozinho. Ele ama fazer as aulas e não falta em nenhuma. O psiquiatra disse que a melhor coisa que a gente fez foi ter colocado ele lá”, conta Rosemeire Paulino, mãe de Luriel.
Mesmo com o desafio de conciliar o trabalho na polícia com o voluntariado e cobrir os gastos envolvidos no projeto, os dois nem pensam em encerrar a dupla. “O nosso pagamento é o sorriso. Sem ele, não temos combustível para continuar. Sempre buscamos, de alguma forma, transformar a vida das pessoas, que às vezes só querem um abraço. Um riso muda o mundo”, diz Wisk