Debaixo de nossa cama,
que tu deixaste vazia,
o meu chinelo reclama
o teu chinelo, Maria!
ANIS MURAD
Usar nome próprio numa Trova demanda certos cuidados. Nas humorísticas, há bastante liberdade. Mas nas líricas, nas filosóficas, se o trovador quiser falar de uma mulher especial, seu único recurso, aceito sem restrições, é fazer uso do nome Maria, simbolizando a mulher inspiradora. Da mesma forma, nomes próprios masculinos também estão proibidos de figurarem na Trova, mas não me lembro de ter encontrado alguma referência de um símbolo para esse caso…
Porém há belíssimas exceções. Uma Trova lírica, bem feita, nunca será rejeitada por usar um ou outro nome de mulher. O nome Maria é um símbolo mas há outros nomes que também são símbolos. Olhem esta joia que Waldir Neves compôs com dois nomes de mulher, uma do povo e outra da nobreza:
Vista seda ou popeline,
seja Amélia, ou seja Inês,
toda mulher se define
no dia em que diz talvez.
Carolina Ramos usa quatro nomes, inclusive dois masculinos:
Foste Jivago… eu fui Lara
e, ao sublimar nosso amor,
foste Francisco e eu fui Clara
num misto de glória e dor!
As Trovas-homenagem também são exceções… de P. de Petrus, homenageando a Rainha da Trova Brasileira:
Oh! Vovó dos trovadores,
que, no céu, o amor expandes,
eu te aclamo, com louvores,
Santa Lilinha Fernandes!
De Rodolpho Abbud, feita para a grande trovadora Nydia Iaggi Martins:
Perdemos Nydia sem dor,
por saber que lá nos céus,
foi receber do Senhor
o maior dos seus troféus!
De João Freire Filho, para o fundador da UBT, Luiz Otávio, cujo nome verdadeiro era Gilson de Castro:
Quanta lembrança querida
de quem pintou céus risonhos:
Gilson de Castro… na Vida;
Luiz Otávio… nos Sonhos!
Nas homenagens a cidades, rios, países, etc., é claro, também podemos usar o nome próprio. De Héron Patrício:
Com seus tons de cinza e neve
a garoa é manto enorme
aconchegando, de leve,
a São Paulo que não dorme…
Para as Trovas humorísticas, qualquer nome é permitido. Mas o bom senso manda que a escolha não seja feita somente para satisfazer a uma rima. Recomenda-se que não se inventem nomes e que, de preferência, ele esteja no meio do verso. O nome perfeito é aquele que conduz o leitor para o efeito humorístico desejado. Por exemplo, nesta Trova de Antônio Carlos Teixeira Pinto, certamente o nome usado não foi escolhido só para servir de rima:
Num enterro de segunda-feira
foi tão grande a confusão,
que uma parte da Raimunda
foi por fora do caixão!
Elton Carvalho usou o nome perfeito para esta Trova:
Toma pílula esquisita
que não serve para nada.
Por isto é que Dona Evita
já tem uma filharada…
O nome Maria também é usado em Trovas humorísticas. De Cypriano Ferreira Gomes:
Por causa da ditadura,
o mordomo de Maria
conheceu uma abertura
que só o patrão conhecia…
E, para não deixar os homens de fora, termino com esta Trova de Maria Nascimento Santos Carvalho:
Cornélio tem um defeito
que a gente sabe qual é,
mas luta pelo direito
de poder usar boné!
NOTA I = Marina Bruna, de tão saudosa lembrança, era dirigente da UBT, Seção São Paulo/SP, e foi, seguramente, uma das mais brilhantes trovadoras de todos os tempos. Nascida em Franca/SP, a 25 de janeiro de 1935 e falecidaem São Paulo, no dia 16 de dezembro de 2013, aos 78 anos.
NOTA II = o presente texto foi transcrito do caderno informativo “LitteraTrova”, nº 13, de outubro/2009, editado por Luiz Antônio Cardoso.